De primeiro foi o boi alçado
E eu andava junto nas arreadas
A solidão do campo, a faca afiada
Bombero e changador atraz do gado
E ai cantei meu mundo que surgia
Nascido com nasce cada lume
Meu canto amanheceu da noite fria
Junto a um fogo bruto sem tapume
Depois veio uma nova circunstancia
Juntou-se pedras pra fazer mangueira
Ergueu-se a casa e a vara da tranqueira
E eu arreei gado pra povoar estancias
E trouxe do tropél as vibrações
No bojo de uma guitarra pagã
Meu canto se benzeu de picumã
Junto ao fogo eterno dos galpões
E sempre de a cavalo olhando o campo
Eu vi rasgarem a primeira estrada
Segui junto do gado o oficio santo
Ponteiro em comitiva de tropeada
E atei num tento forte o instrumento
A guitarra pra ser Deusa dos caminhos
E cantei as soledades e carinhos
Junto aos meus nos fogões de acampamento
Se o campo hoje é de cercas e potreiros
Que importa, pra mim que vim dos ontontes
Meu alcance é o fogo grande dos campeiros
Prendido nas baetas do horizonte
E assim eu cantei trezentos anos
Sem glórias, sem riqueza e sem luxo
E quanto mais arame atora o campo
Mais inteiro é o sentimento de gaúcho